terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Crônicas da Rua da Carioca II

Me lembro bem de ter uns 8 ou 9 anos na ocasião. Fui ao centro com minha mãe ver não lembro o que, mas o fato é que estava sentada na janela do 240 quando tudo aconteceu. O trânsito estava caótico, era final de tarde. Minha hora preferida do dia. Depois de algum tempo parada na Rua da Carioca, eu o vi: Era um menino, não consigo dizer quantos anos, sentado nos degraus de uma antiga loja de instrumentos musicais, chorando.

Uma mulher veio de lá de dentro, colocou a mão no seu ombro e fez aquele movimento de carinho, como quem consola sem palavras. O menino chorava copiosamente e eu não conseguia parar de olhar. Lembro que senti uma enorme solidariedade por ele. Eu não tinha a mínima idéia de porque chorava, mas minha vontade sincera era descer do ônibus e ir até lá saber. Não por curiosidade ou desejo de fofoca, mas pelo meu encanto infantil com a situação.

Lembro ainda hoje (talvez por ainda sentir) do fascínio que o Centro me causava, com suas construções antigas, seus prédios e ruas. Mas desde sempre a Rua da Carioca era a que me despertava mais fascínio, nunca soube bem porque. Só sei que ali, no final da tarde, de dentro do ônibus, vivi minha primeira paixão infantil. Pensei naquele menino por dias, noites, meses. Pensei na tristeza e em porque afinal ele chorava. Inventava histórias mirabolantes na minha cabeça, sobre instrumentos que desejava e não podia ter, sobre tudo que ele desejava e não tinha. Imaginava que um dia, sem mais nem menos, eu o encontraria pela rua e saberia que era ele. Eu nunca encontrei. Mas se encontrasse, não saberia mesmo.

Só sei que hoje percebi que ainda penso nele. Nele, no fim de tarde, na loja e no choro. Acho que a tristeza alheia mexe mesmo comigo. Acho que me apaixono sempre pela tristeza que sinto emanar dos outros. Como se eu pudesse de repente consertar tudo e deixar mundos coloridos. Como se juntando as tristezas, eu pudesse de repente me sentir também feliz. Não sei. Daí o trânsito andou, e com ele o ônibus. O meu menino que chorava na loja de instrumentos ficou pra trás. Ficou pra trás pra sempre.

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