segunda-feira, 12 de abril de 2010

The long and winding road

E então ela chorou. Chorou por alguns minutos, de um jeito pesado que eu nunca tinha visto ela chorar antes. Sei que chorou assim porque percebeu que suas atitudes alteraram não só a minha vida como a de outras pessoas, e talvez porque tenha finalmente percebido o mal que me fez com isso tudo.

Vai ver ela chorou ao me ver chorando compulsivamente. Porque eu senti que era um choro de tristeza, um choro de quem diz "meu Deus, o que foi que eu fiz?". Era um choro que cessou logo em seguida, quando ela começou a falar sobre como algumas culpas foram minhas e nada tiveram a ver com ela. Eu sei que sim, mas a raiz delas está nela, sempre esteve. Não quero culpar ninguém e não preciso: Eu assumo minhas culpas e na realidade costumo remoê-las, mesmo involuntariamente. E por isso sei que a origem de tudo não foi problema meu nem culpa minha. Eu errei, errei muito, mas sei que tudo seria bem diferente sem a interferência dela.

Acho que até hoje de manhã ela não tinha mesmo se dado conta do estrago que fez. Acho que nem mesmo eu tinha me dado conta de todo o estrago. Parece que dormi por tempos, e quando abri os olhos tudo estava mudado. Fica no final esse aperto no peito, essa sensação de não poder fazer nada. Talvez seja isso o que dói mais. Ou talvez nem tenha doído. Talvez eu já nem sinta.

Só sei que coloquei uma pedra no passado, dessa vez de maneira definitiva. Eu me sinto desolada por motivos que ninguém além de mim vai entender. Eu me sinto como se uma parte enorme de mim tivesse morrido.

No meu mundo todas as coisas supostamente eternas acabam morrendo. Fica a lembrança, mas o que a gente faz com a lembrança do que seria eterno? É como pedir pra alguém viver no escuro pensando no sol: Lembrar dele não vai trazer a luz de volta.

Eu não queria que o passado voltasse. Eu não abriria mão de nada que tenho hoje. Sendo assim, prefiro pensar que tudo que aconteceu fez de mim a pessoa que sou. Fez de mim um pouco menos fria e despreocupada com a vida. Fez de mim uma mulher. Me fez muito menos leviana, e infinitamente mais preocupada com o coração alheio. Tudo que aconteceu me fez percorrer os caminhos que me levaram ao ponto onde me encontro. E eu não me sinto infeliz com o lugar onde estou.

Eu ontem andei o caminho até a porta dele pela última vez. Aquela nem é mais a porta dele e eu não estava sozinha. As nossas vidas mudaram sem que nós dois percebessemos. Parecia que ia ser pra sempre aquela amizade sem tamanho. Parecia mesmo que eu ia poder continuar ligando e aparecendo sem avisar. Que a campainha ia tocar e a gente ia ficar por horas sem fazer nada, rindo um da cara do outro e pensando na vida. Que eu ia poder sempre ligar pedindo companhia, e mesmo estando muito longe ele iria até lá. Mesmo que muito longe fosse o caminho do portão até o banco, só pra me salvar da fila.

Parecia que um dia todo mundo ia entender que era só isso, que era inocente e só. Que era amor como se ele fosse um irmão que eu nunca conheci, e que eu podia dormir do lado dele sem que nada acontecesse. Que a gente podia brincar de cosquinha e de porrada. Que a gente podia andar pelas pedrinhas pretas e brancas do chão do centro, correndo, sem querer saber do que os outros pensavam. Parecia que um dia ia ser possível ser criança assim pra sempre e ser feliz. Mas acontece que ninguém entende, nem nunca vai entender. Ninguém nunca vai alcançar, e a vida fez o favor de deixar isso tudo pra trás. Fez o favor de colocar pelo caminho escolhas sem retorno.

E então eu chorei ao perceber que finalmente ficou pra trás. E ela chorou de ver que isso me deixou tão mal. Ela, assim como todo mundo, não compreende. Ao menos ela agora se sentiu um pouco culpada pelo fim disso tudo. Ela, assim como todo mundo, nunca vai compreender.

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It won't lead me to your door anymore. Nevermore.

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