segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Ele tem uma espécie de pureza nos olhos que me incomoda. Olha pra tudo com um olhar meio infantil, meio de sonho, contemplação. Usa um chapéu engraçado na cabeça, anda devagar, cabeça baixa. Fala baixa também, e uns sorrisos devagares. Tem um ar triste, triste que só, um ar de quem tem por dentro mais do que aparenta. Porque ele aparenta ser só tristeza, e talvez isso que me incomode. Não tem jeito de quem tem por aí muitos amigos ou amores. Tem jeito de quem tem apenas tristeza.

Eu não sei como ele vive, não faço idéia de se tem ou não família, filhos. Mas a minha mente viaja imaginando ele chegando na casa vazia, acendendo uma ou duas luzes, tomando um copo d'água. Comendo sozinho uma refeição, na mesa da cozinha, depois de cozinhar alguma coisa em porção única. Eu o imagino vendo tv, ou lendo um livro, ou ouvindo rádio, sozinho. Imagino a sensação de silêncio inviolável que paira pela casa, as paredes meio amareladas e a cama antiga no quarto. A cama onde ele se deita, sozinho, e vai vendo noite após noite passar.

Me lembro do primeiro dia em que falei com ele. De todas as pessoas falantes na mesa, ele era o mais calado. Como se o corpo estivesse ali, mas a mente estivesse viajando longe. Lembro que na foto que tirei ele ficou meio escondido atrás de alguém e não aparece, mas dá pra perceber que estava olhando pro nada. Comi do que ele ofereceu, repeti, dei atenção. Talvez por me sentir tão sozinha, por tanto tempo, eu sinta a solidão alheia. Talvez eu sinta a necessidade de afeto que emana de certas pessoas. Porque uns escolhem ser sozinhos, outros simplesmente se fecham, mesmo querendo se abrir. Mas existem terceiros que são simplesmente sós. Esses terceiros não tem escolha, nem opção. A simplicidade dessa solidão me comove, porque soa como uma não aceitação própria, que gera uma não aceitação dos outros.

Pode ser que eu esteja enganada, e que ele na realidade tenha milhares de amigos, saia muito, conheça muita gente. Pode ser que ele tenha uma família bonita e feliz. Mas eu duvido muito, não sei porque. A sensação de vínculo que a tristeza trás é sempre muito forte. Um triste reconhece um triste. Ao menos eu reconheço.

Só sei que nesse momento eu imagino ele lá, sozinho. E isso enche meus olhos de lágrima.

Nenhum comentário: