quarta-feira, 22 de julho de 2009

Como bolinhos de chuva.

Encare hoje como o primeiro dia do resto da sua vida. Aquele dia em que tudo começa, e que faz o amanhã ser sempre inesperado. Encare cada fato, mesmo pequeno, como um acontecimento mágico. Mas faça isso com os fatos bons, ainda que aparentemente ínfimos. Os beijos, abraços, as palavras de carinho. Faça isso com a borboleta que você viu, e com o jeito como os carros passam apressados na rua. Guarde cada coisa num cantinho da mente, onde você possa encontrar com facilidade quando o amanhã chegar.

Sobre os fatos ruins, ignore-os. Afinal, esse é o seu primeiro dia. Leve o possível na brincadeira, e o impossível trate de jogar fora, jogar pra bem longe. Pegue as decepções e medos de hoje, amasse e jogue na lata do lixo. Você não quer lembranças ruins no seu começo. Você pode esperar o amanhã para tê-las, se por algum motivo desejar lembrar de coisas ruins. Eu recomendo nunca dar importância. Porque essas lembranças são como um bolo cheio de fermento, e vão crescendo, crescendo, até estourar e te deixar vazio, murcho.

E então, primeiro dia. Se lembre da escola, e de como sentia frio na barriga só de pensar no início do ano. Resgate a sensação pura e simples da vontade de rever os amigos, de comer bolo na cantina, de aprender. Resgate o pique-esconde e os trabalhos em grupo. Resgate aquela sensação leve e gostosa que eles traziam. Porque mesmo que na época algumas situações parecessem tenebrosas, hoje você sabe que aqueles eram sentimentos leves, se comparados a tudo que pode sentir.

Pare hoje pra falar. Fale pausadamente, ouça o que diz. Não se pode exigir que alguém nos ouça quando nem nós mesmos nos ouvimos. Ouça o som da sua voz, o peso com que descreve cada situação, com que faz cada pergunta. Ouça os outros também, hoje existe tempo pra tudo. Olhe nos olhos quando falar e quando ouvir. Guarde esses olhos na memória, sejam eles de quem forem. Guarde o maior número de olhares que conseguir, nesse seu começo de vida. Você vai precisar deles amanhã, quando o caminho parecer sombrio. Vai precisar de olhos pra te guiar, muito mais do que de palavras.

Palavras. Jogue palavras ao vento, mas não faça isso levianamente. Jogue com cuidado para não quebrar, para o vento não levá-las com força e para não machucarem ninguém. Solte sussurros, eles voam com mais facilidade e assim chegam mais rápido. Assopre as palavras pelo ar como bolhas de sabão, como folhas secas dançando ao vento. Como primeiro dia de todo o resto, você vai querer ser rapidamente lembrado pelo que diz e faz, mas não se apresse: Se você fizer tudo do seu modo, no seu tempo, será recordado da melhor maneira. Talvez não por todos, mas por aqueles que realmente importam, aqueles que você ama e pelos quais realmente vive.

Enfim. De qualquer maneira, hoje é o primeiro dia do resto da sua vida. Mesmo que você não o encare como tal. Hoje é sempre o começo, porque amanhã pode nem existir. A possibilidade de inexistência do amanhã não deve portanto o fazer encarar hoje como um possível fim. Porque se você ainda o tem pra tentar, tem então preciosas horas pela frente. A vida é preciosa demais pra se acreditar nos anos que vêm, temos que dar valor a ela agora. Sendo assim, diga, veja, ouça, sinta, pergunte, responda, corra, grite, sorria, faça alguém sorrir, olhe pra alguém, entenda alguém, conforte. Viva com o gosto e a felicidade de quem come o primeiro bolinho de chuva, e não se importa de queimar a língua, porque sabe que o prazer vai compensar a dor, sempre.

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